segunda-feira, 26 de abril de 2010

A prosa de Miguel de Cervantes

    
   Nasci livre, e para poder viver livre escolhi a sociedade dos campos; as árvores destas montanhas são minha companhia, as claras águas deste arroio meus espelhos; com as árvores e com as águas comunico meus pensamentos e formosura... O céu ainda até agora não quis que eu ame por destino e pensar que tenho de amar por escolha é discutível... Quem me chama fera e basilisco, deixe-me como coisa prejudicial e má; quem me chama ingrata, não me sirva; desconhecida, não me conheça; cruel, não me siga... Se conservo minha pureza na companhia das árvores, por que há de querer que a perca quem quer que a tenha com os homens? Eu, como sabeis, tenho riquezas próprias e não invejo as alheias; tenho livre condição e não gosto de sujeitar-me; nem amo nem detesto ninguém...Têm meus desejos por termo estas montanhas, e se daqui saem é para contemplar a formosura do céu, passos com que caminha a alma para sua morada primeira.

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