domingo, 12 de junho de 2011

15 DE SETEMBRO - Lygia Fagundes Telles


   Se a vida estiver lá fora, nessas vozes que desdenhei? E se o desvio da minha rota foi exatamente esse que escolhi? Mas haverá ainda tempo?
   Fico olhando o besourinho lustroso, de pintas vermelhas no verde-esmeralda das asas. Atravessa minha mesa num andar enérgico, decidido - de onde veio e para onde vai? Toco-o com a ponta do dedo e imediatamente ele se imobiliza dentro da pequena carapaça, se faz de morto. Sua tática de defesa me emociona, também me fiz de morta tantas vezes. Tenho vontade de colher o besourinho na palma da mão e levá-lo até os potes de samambaia, não seria mais feliz lá? Fico vacilante, o que é  bem para mim pode ser o mal para ele. A ambiguidade do Bem. Afasto-me para que ele não se sinta tolhido, quero-o livre. Observo de longe a bolinha verde-esmeralda que ressuscita e retoma sua marcha. Retomo a minha.

       (Do livro A disciplina do amor)

Um comentário:

  1. Olá, Telma
    Postagem maravilhosa! Gosto muito da Lygia F. Telles.
    Também li "A disciplina do amor" e peço licença para registrar um trecho que me chamou a atenção:

    "10 de dezembro
    Se sou amada, tenho esperança - descobri hoje cedo. Mas amada por quem? Não por mim mesma, seria pedir demais. Pensei em telefonar para os amigos mas hoje os amigos estão ocupados. Ou ausentes (...)"

    Beijo e obrigada.

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